O Perfil do Advogado moderno
O Perfil do Advogado moderno
Por Léo da Silva Alves
O sucesso no exercício da advocacia não depende apenas do conhecimento. É vidente que o domínio técnico é fundamental, mas não pode estar desacompanhado de certo marketing pessoal. Não é incomum vermos pessoas que obtiveram graduação com louvor; e ainda fizeram Mestrado e Doutorado. E, mesmo assim, não conseguem um só cliente ou sequer uma colocação no mercado que seja compatível com o conhecimento adquirido. Por que isso acontece? Porque são indivíduos que mergulharam nos livros e esqueceram do mundo.
O mundo não é composto somente de teses jurídicas, de legislação e de decisões dos tribunais. Pelo contrário, essa é apenas uma parte – minúscula – do mundo que nos rodeia. Logo, o advogado precisa relacionar-se de forma apropriada com tudo aquilo que está à sua volta. E, para início, deve considerar que a apresentação física é importante numa sociedade de consumo, seletista, egoísta e por vezes preconceituosa. E a educação, em todos os momentos, fará a diferença.
Não faça confusão, a propósito, entre educação e cultura. Esta, diz respeito ao saber; aquela, ao relacionar-se em sociedade. Reunindo ambas, o profissional abrirá as portas do sucesso.
O MUNDO FORA DOS TRIBUNAIS
O profissional do Direito não vive apenas para as labutas forenses ou atividades jurídicas de consultoria e de partido. Antes de tudo, é um cidadão, integrado a uma comunidade, com relações em diversos segmentos da vida social. Sua postura, portanto, não se restringe aos momentos de paletó e gravata – ou o equivalente para as damas – no expediente convencional, mas estende-se para os demais horários, os demais locais, como restaurantes, quadras de esporte e reuniões festivas, e para os relacionamentos com vizinhos, amigos e – por que não? – amorosos.
Desde o advento dos primeiros cursos jurídicos no Brasil, seguindo-se a bela tradição de Coimbra, cultuou-se a áurea de respeito em torno dos profissionais da área jurídica. Magistrados, membros do Ministério Público e advogados eram sempre vistos – e retratados na literatura pátria – como pessoas bem apresentadas, com articulação e modos, com elegância e requinte. A tradição não esmoreceu, em que pese a vida moderna ter banido certos hábitos da boa civilidade. A pressa do cotidiano, o stress dos atribulados dias dos profissionais em geral e a disputa no concorrido mercado de trabalho têm, entretanto, deixado em segundo plano as boas regras de conduta. E os próprios cursos jurídicos pouco – ou nada – têm contribuído para incentivar os jovens no terreno das boas maneiras.
Certo dia, um jovem advogado, formado com as melhores notas, apontado como de promissora carreira, chegava a um almoço em restaurante de hotel cinco estrelas, convidado para integrar uma mesa ao lado de juristas de expressão nacional, em Brasília. Era visível, todavia, a falta de familiaridade com o básico da etiqueta. A forma de manusear os talheres, o trato com os garçons e o palito atravessado na boca mostravam alguém que não se preparou para o convívio social. Logo, ficou ali esbarrada qualquer possibilidade de incorporar-se ao grupo. Jogou por terra o que poderia ser a chance da sua vida. (Aliás, é na mesa de refeições que se conhece a educação da pessoa!)
A Constituição, bem sabemos, veda a discriminação, como ordem geral. Mas não podemos fechar os olhos para a realidade do cotidiano no que diz respeito à imagem que umas pessoas fazem das outras. Não é exatamente discriminação, mas é, digamos, seleção. É um processo mental, que independe da consciência do indivíduo.
Então, grave definitivamente essa regra: a roupa, como principal item da apresentação pessoal, faz diferença.
Em vários concursos públicos, advogados acabam barrados por usarem tatuagem ou brincos. Envolvem-se em longas e constrangedoras discussões nos tribunais... O ideal seria compreender que algumas profissões exigem mais da postura e da apresentação das pessoas. Aquilo que fica natural em um mecânico ou em um jogador de futebol, descredencia, profissionais de outra escala. Vale para a forma de vestir. Minissaia e barriguinha de fora não se prestam para a jovem advogada; tênis e calças jeans são péssimos referenciais ao advogado de verdade.
O cabelo também é importante. Nas mulheres, nem se fala. Se a mulher não cuida do cabelo, não cuida do processo. Esse raciocínio simplista vem à mente sem que a pessoa queira.
Cada um tem a liberdade de vestir-se e andar como quiser. É garantia constitucional. Mas que arque, então, com as conseqüências da inadequação, da falta de gosto, da insensibilidade para os critérios do mercado.
Vestir-se bem não significa griffes famosas. Significa estar de acordo com o ambiente. E, para o advogado, acreditamos, a palavra ambiente não deve ser tomada apenas como escritório e tribunais. É a entrevista, é a reunião, é a rua; é o shopping, é o cinema... Ele precisa vender, por onde andar, a imagem de respeito, de austeridade.
O mundo vive de aparências. Podemos não gostar disso, mas é a verdade. Como nós não mudaremos essa verdade, então, tiremos dela o melhor proveito.
NÃO DISCUTA
É comum estabelecer-se uma discussão em grupo. Alguém insiste num ponto de vista e, sobre ele, mostra-se irredutível ou, no mínimo, entusiasmado. Não jogue água fria. Não tente impor a sua opinião. Guarde isso para os embates nos tribunais.
Qual será a vantagem em alimentar polêmica, quando o interlocutor está demasiado envolvido na idéia? Quem se arriscar a tanto será um chato, inconveniente. Um estraga-prazer. Claro, porque o outro não será convencido. Ou nunca admitirá isso. No máximo, se o ambiente for propício, diga que tem "dúvidas" e aponte, sem destempero, as suas razões. Mantida a celeuma, invente uma frase de efeito e caia fora.
RESPONDA A CORRESPONDÊNCIA
É extremamente deselegante receber um cartão, a oferta de um livro, o convite para um evento e ficar calado. Pelo menos um telefonema a pessoa merece. O ideal, na verdade, é ter um cartão personalizado para enviar, manuscrito, com duas linhas de gratidão. É impressionante a carência de educação nesse sentido. Perdeu-se completamente a noção dessa regra básica de civilidade.
Nós, por exemplo, recebemos freqüentemente pedidos de orientação, de indicação de material, da oferta de uma obra, etc. Ao atendermos, nunca mais recebemos uma palavra daquele que pede. Sequer avisa que recebeu... Isso se repete tanto que, quando alguém agradece, a gente se impressiona! O que é raro fica na lembrança. Integre, portanto, o elenco dessas raridades. Respeite quem lhe teve consideração. Lembre-se de quem lembrou de você. Dê um minuto do seu tempo a quem, talvez, gastou horas para atender a um pedido seu. De mal-agradecidos, já se disse, o inferno está cheio.
SELECIONE OS AMBIENTES QUE FREQÜENTA
Nenhum jurista, por certo, será avistado atrás de um taco de sinuca ou bebericando cerveja na mesa de um botequim. Vá, portanto, a lugares sadios. Se for preciso, economize três meses o dinheiro que gastaria bebericando nos fins-de-semana em botecos da vida. Poupe, junte, para utilizá-lo, mesmo que em um único dia no trimestre, em restaurante de classe, onde possa ser avistado e reconhecido. Freqüente teatros em vez de cinemas com filmes vulgares; troque os estádios de futebol por um espetáculo cultural. Não é questão de gosto. É questão de bom gosto, que se reflete na imagem pública, necessária ao sucesso profissional.
Freqüente uma igreja. Escolha. São muitas. Além do exercício da fé, imprescindível ao conforto do espírito, fortalecerá, perante a sociedade, a sua imagem de pessoa de bem.
Saia do lugar comum. Encontre a luz que há fora dos prazeres mundanos. Ela iluminará, como raio de sol, a sua vida; será como uma alvorada, anunciando o nascer de uma promissora carreira. Deixe o copo de cerveja do bar da esquina, o taco de sinuca e a histeria dos estádios de futebol para quem não tem o horizonte que se descortina na sua frente.
NAS LIDES FORENSES
Destaque-se pela qualidade do seu trabalho, e não pela truculência. Não seja aquele que quer resolver as pendengas aos gritos. Se magistrado, não tome a investidura de um deus, poderoso e absoluto. A autoridade não é incompatível com a civilidade. Se for recolher características da divindade, que aproveite a serenidade, a compreensão e a condescendência.
a) Como advogado, estabeleça a diferença entre defender uma causa e ofender um colega. Mandamentos éticos são imperativos.
b) Na acusação, seja prudente, Montesquieu advertiu: A injustiça feita a um homem é uma ameaça feita a humanidade.
c) Não seja dono da verdade. Psicólogos dizem que algumas pessoas cometem dois erros grosseiros: 1) acreditam que a verdade existe; 2) acreditam que são donas dela. Trabalhe com a sua verdade, sem duvidar da hipótese de existir uma verdade diferente.
d) Estude e prepare-se. O bom profissional tem lastro de conhecimento.
e) Nas intervenções orais, seja prático e objetivo. Estude as boas técnicas de comunicação.
SEJA PONTUAL
É medida primária de respeito. A desculpa da falta de tempo deve ser entendida como falta de planejamento. Quem se atrasa, não é ocupado, é desorganizado.
HONRE A SUA PALAVRA
Seja alguém merecedor de crédito em todas as circunstâncias. Muitas vezes o advogado precisa ajustar com um colega uma troca de data, um exame de documento, um prazo para examinar um assunto antes de medida judicial. Isso precisa ser honrado. Nunca traia a confiança. A palavra dada deve ser lei.
Não banque o esperto, como aquele general da antigüidade, que firmou, com o comandante inimigo, uma trégua de sete dias. Na sexta noite, atacou, dizimando o exército adversário, que dormia seguro da paz que fora ajustada. Depois, o general justificou: o compromisso era por sete dias. Nada fora tratado sobre as noites...
LÍNGUA PORTUGUESA
Até a primeira Constituição da República, tínhamos um sistema processual que privilegiava a sustentação oral. Por isso, até hoje atribui-se ao advogado a condição de orador. Em qualquer reunião, até do condomínio do prédio, se alguém tem que usar a palavra, esta é passada preferencialmente ao advogado presente.
Muitos profissionais da advocacia entraram para a história por grandes atuações no júri.
Hoje, a advocacia é, basicamente, escrita. O advogado tem que saber escrever. E, para isso, tem, antes de tudo, que ler muito. Só a leitura dá ao indivíduo a base para escrever bem. E não se trata apenas de escrever bem nas petições. Até o bilhete ao porteiro do prédio deve ser bem escrito. Em linguagem adequada, simples, mas com correção de forma e de ortografia.
O advogado não pode ser a pessoa que só conhece português pelo tamanho do bigode e o cheiro do bacalhau. Tem que ter segurança na língua pátria. Ou aquilo que escreve será desmoralizado de pronto.
Na mesma linha está o falar. Gírias, palavras com pronúncia errada, engolir o "s" quando a palavra deveria estar no plural... Isso tipifica um crime hediondo para o profissional de Direito. Deveria dar cadeia ao assassino da língua-mãe.
Cuide, portanto, disso. Faça as pazes com Manuel. Ou seja, o português. Trate-o bem. Quem ganha é você, em respeito, em imagem, em credibilidade.
O USO DO TELEFONE FIXO
O telefone já existia ao tempo de D. Pedro II. Aliás, Imperador moderno para os padrões da época, era fascinado por pesquisas, ciências e desenvolvimento tecnológico. Fez questão de trazer para o Brasil o aparelho que revolucionava as comunicações. Mas, curiosamente, findo o período imperial e decorrido mais de um século de República, ainda são muitas as pessoas que não sabem usar o telefone.
Algumas palavras de ordem para o uso civilizado:
• Se a ligação for da sua iniciativa, seja breve. Você não sabe o que a outra pessoa está fazendo, com quem está, quais os seus compromissos no momento, qual a disposição em falar... Ligue, diga o essencial e, se for o caso, aguarde a iniciativa do interlocutor em estender a conversa.
• Identifique-se imediatamente. Nunca comece com "Quem fala?" Afinal, se essa dúvida existir, é de quem recebe a ligação. Pessoa educada liga e identifica-se prontamente.
• Ao atender pessoalmente uma ligação, seja polido. Pode ser o vendedor da farmácia, o rapaz que faz dedetização, um cliente de futuro ou uma autoridade. Não assuste no primeiro contato. Todos merecem tratamento digno. Quem fica dignificado, engrandecido, valorizado, é você.
• Evite que a secretária ou outra pessoa faça a ligação e deixe o interlocutor esperando na linha. Se a ligação é sua, o interesse é seu. (Alguns deputados, em Brasília, surpreendiam-se com ligações feitas pessoalmente por certo presidente da República. Achavam que era trote. Não era. Tratava-se de uma deferência, de um homem educado.)
• No seu escritório, desenvolva um treinamento específico para a sua secretária e para o pessoal de apoio. O primeiro contato do cliente, muitas vezes, é exatamente pelo telefone. Se for mal-atendido, desliga e desaparece.
• No escritório, tenha mais de uma linha. Ninguém tem tempo para ficar perdendo com tentativas em ligações que não podem ser completadas. (As companhias telefônicas dispõem de serviço de busca automática. Quando uma linha está ocupada, é feita automaticamente a transferência para outra.)
O USO DO TELEFONE CELULAR
Vamos, agora, a algumas observações sobre o telefone celular.
Símbolo da modernidade, o aparelho tornou-se indispensável a qualquer pessoa. Todavia, a sua utilidade não pode atropelar regras básicas de educação. É impressionante a falta de respeito, a grosseria, a má postura que se vê, até mesmo entre membros do Congresso Nacional, em relação ao uso desse equipamento. Quando ele toca, as pessoas parecem perder todo o senso de escrúpulo, toda sensibilidade em relação aos presentes, toda a noção de oportunidade e conveniência.
Então, registre-se pelo menos o seguinte:
• Nunca deixe o celular ligado em uma reunião ou quando estiver atendendo a um cliente. O interlocutor precisa sentir-se a pessoa mais importante do mundo. (Se estiver esperando um contato urgente, deixe o aparelho fora da sala, com outra pessoa.)
• Mantenha o celular desligado em conferências, teatros, igrejas, cinemas, etc. É elementar. Mas, por incrível que pareça, ainda é preciso avisar isso.
• Atender o telefone nesses lugares é igualmente indelicado. Talvez a campainha não incomode, mas incomoda a pessoa que está atendendo a chamada. Os outros não são surdos. O mínimo cochicho nesses ambientes interfere na concentração do palestrante ou na atenção do auditório. Não corra, portanto, o risco de ser repreendido em público. Isso é coisa para moleque.
• Em restaurante, desligue, por favor. As pessoas nas mesas ao lado não têm a obrigação de ficar escutando a sua conversa com a secretária, com o cônjuge ou com um cliente.
• O ser humano passou pelo menos seis milhões de anos sem depender do telefone celular. E – guarde isso – sobreviveu. Então, você não precisa estar com o aparelho ligado 24h, importunando os outros. Você sobreviverá sem ele, por alguns minutos.
• Lembre-se, ainda, de que talvez não exista no mundo pessoa mais ocupada que o Presidente dos Estados Unidos da América. E ele não vive com o celular pendurado na cintura ou grudado na orelha. Tudo depende de organização.
CARTÃO PROFISSIONAL
Todo advogado organizado deve ter o seu cartão de visitas. Entretanto, não é um cartão qualquer. Não pode ser enfeitado demais, como cartão de oficina mecânica, com desenho de automóvel e um slogan publicitário. Não deve ser impresso em papel colorido. E precisa ser econômico no conteúdo. Colocar informações excessivas causa uma poluição visual. (Outro dia, recebemos um cartão que tinha até Salmo impresso. É lógico que não é o espaço adequado para professar a fé.)
O cartão é uma forma de propaganda discreta. Tem que ser elegante. Em papel especial, branco de preferência, coloca-se o nome do profissional, a informação da profissão e da especialidade e uma indicação de telefone. No máximo, mais o endereço eletrônico. Esses dados são suficientes. Afinal, se a pessoa se interessar, obterá pelo telefone os dados complementares.
LÉO DA SILVA ALVES é professor de Direito em Brasília e conferencista, com trabalhos no Brasil e no exterior, autor de mais de 20 obras, preside o Centro Ibero-Americano de Administração e Direito.